Ele trabalhava em meio a cores e sorrisos. Ele era cores e sorrisos. Para os outros. Léo trabalhava num circo como um palhaço e seu trabalho era pintar a cara de uma coisa que ele não era e arrancar sorrisos das pessoas. Foi assim que o conheci. Colorido e sorrindo. Eu tinha acabado de chegar no circo, não conhecia muita gente e passava a maior parte do meu tempo livre lendo no meu trailer ou passeando pelo circo, ansiando uma conversa, um amigo, um amor.
Foi numa dessas caminhadas, que comecei a observá-lo. Ele estava deitado numa rede e tinha uma cara fechada. Não fechada de chateação, mas uma cara retraída, até meio amargurada. Pensei que ele pudesse estar num dia ruim. Até os palhaços tem seus dias ruins, não é? Mas algo mais me chamou atenção nele. Não sei o que. Mas me sentei e continuei observando.
Vi anoitecer, ele entrar e começar a se pintar. Ele saiu de seu trailer com a mesma cara fechada, acho que nem me notou. Saiu com aquela cara triste e só foi entrar no picadeiro para que o seu rosto se iluminasse, mudasse totalmente. Nem parecia a mesma pessoa.
No outro dia, voltei. Sua cara não mudara e não mudou durante a semana inteira. Às vezes o pessoal do circo se juntava pra conversar. Ele sempre estava lá, conversava com um, com outro, mas sempre ia se deitar cedinho.
Não sei por que eu cismei com ele. Talvez pela idéia de alegria que um palhaço me passa. Uma alegria e uma complexidade, percebi depois. Pra mim, antes de conhecer o Léo, os palhaços eram sempre felizes. Todo mundo tem que ser feliz. Por que ele não?
Nunca, em nenhum momento passou pela cabeça das pessoas que viviam com ele no circo, que ele era o Léo, não aquele palhaço. Ele tinha seus sentimentos, tinha suas saudades e suas tristezas. Mas ninguém o conhecia.
Eu olhava pra ele e ficava com vontade de chegar, conversar e depois, sem eu perceber, tive vontade de ser o ouvido para os seus problemas, o ombro amigo, o abraço querido. Comecei a pensar nele.
Nunca tinha me apaixonado, não sabia nem o que era isso. E aquilo estava começando a fugir do meu controle, eu precisava botar pra fora.
Um dia eu sorri pra ele. Ele demorou um pouco, acho que se tocando que era pra ele mesmo e então sorriu de volta. Que sorriso lindo! Sorriso dele. Do Léo, não do palhaço. E pra mim. Esse sorriso me fez andar até e lá e o abraçar. Ele não precisou entender, me abraçou forte e ficamos um tempo assim. Depois nós sentamos e conversamos até anoitecer, chegou a hora do show e eu nunca dancei como naquele dia. Quando ficava na ponta do pé, parecia que eu flutuava. E eu sorria! Um sorriso de quem achou o que sempre esteve procurando. Ele me olhava lá de dentro e eu pude jurar que vi os seus olhos brilhando.
Depois do show continuamos a conversar e fomos até o sol aparecer. Ele falava, falava e parecia que aquilo estava guardado a tanto tempo que eu só conseguia ouvir e olhá-lo e eu podia ficar assim por horas.
Pois é. Ele só precisava de alguém. E eu, mesmo sem saber precisava dele. E foi assim. Como eu me apaixonei. Cuidado com sorrisos.
Larissa Fontes
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