domingo, 28 de setembro de 2008

Tanto nós


O telefone tocou. Estava absorto em mais um momento comigo mesmo. Me ouvia, me explicava, embora não me compreendesse. Era você. Fazia tempo que não escutava a sua voz e não sei colocar em palavras o que senti quando me dei conta.
Hoje você me ligou. Me chamou no telefone e eu senti minhas pernas estremecerem. Depois de tanto tempo, ouvir sua voz de novo. E mesmo assim senti tudo voltar, todas as sensações, os sentimentos, os formigamentos e até aquele aperto no coração que eu sentia sempre a qualquer palavra sua. Eu sei do que vai acontecer quando eu chegar, sei das coisas que vamos fazer e no final sei da briga que vamos ter. Até posso ouvir o tom das nossas vozes subindo cada vez mais, a raiva se mostrando. Raiva com amor. A mistura mais comum nos relacionamentos. Ninguém deixa de amar na raiva. Mesmo quando as duas pessoas estão se odiando, se amam. Se amam nos olhos, nas atitudes contrárias ao desejo real e até no orgulho teimoso. E mesmo tendo essa consciência, tenho raiva de você, te odeio, mas te amo e por isso nesse momento essas coisas estão passando na minha cabeça enquanto dirijo em direção ao que foi a nossa casa.
Vou passando pelas ruas que a gente costumava percorrer quando batia aquela vontade de tomar um vinho e olhar o movimento das pessoas. Nos sentávamos sempre na mesma mesa daquele mesmo bar. A nossa mesa e o nosso bar. Agora ela tá vazia. Estou com vontade de me sentar lá e ficar lembrando da gente. Mas isso iria doer. Acho melhor continuar. Continuo e vou chegando no fim da rua. Lá tem o nosso cinema. Perceba que nada mudou. Só eu e você. O que não deveria ter mudado nunca, mudou.
Tenho vontade de fechar os olhos pra não ter que ver tanto nós em tudo.
Chego e vejo que você ainda não aprendeu a colocar o carro pela garagem do vizinho, ele continua estacionado torto. Sorrio baixinho. Encosto a cabeça na parede do elevador e fecho os olhos respirando fundo enquanto ele sobe. Tento ensaiar alguma frase pra descontrair, mas como não consigo, resolvo deixar no improviso mesmo. Costumo fazer isso quando não sei o que dizer. Vou no impulso. Quando vi, já foi.
E você abre a porta com aquele roupão que eu brincava dizendo que era sua tatuagem, mas era só uma brincadeira, porque eu acho que não existe uma roupa que lhe caia tão perfeito quanto esse roupão. É assim que eu te imagino, assim que eu te vejo nos meus pensamentos. Até sonhei uma vez. Nenhuma frase consegue sair da minha boca, então te puxo pra um abraço e não sei quanto tempo fico te sentindo tão perto.
Então logo depois, vem a primeira alfinetada. O primeiro descompasso. Que puxa a chuva de insultos e ofensas. Jogando a culpa um pro outro como se brincássemos de bola.
Estou vendo você na minha frente, tão alterada, as lágrimas caindo sem querer dos seus olhos, sei que tá doendo em você e tento te dizer que dói em mim também, mas você está surda, só sabe falar, falar, falar.
Corro pra você, te calo com um beijo e...

Acordo com o sol na minha cara, quando viro pro lado, você dormindo ao meu lado, toda linda. Ainda segura a minha mão.

Larissa Fontes

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